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Na Itália, derrota da esquerda dá início à “Terceira República Presidencialista”
Pela primeira vez desde 1945, Parlamento não contará com a representação histórica de comunistas
Achille Lollo


Pela primeira vez o Parlamento italiano será totalmente “burguês” e sem a representação histórica de comunistas, socialistas, altermundialistas, feministas, verdes e defensores de direitos humanos que desde 1945 exerciam o papel de “garantidores da democracia e da Constituição”. Por absurdo que pareça, o principal articulador do esvaziamento eleitoral da esquerda não foi Berlusconi, mas sim Walter Veltroni e D’Alema (ex-Partido Comunista Italiano) e hoje líderes do novo Partido Democrata.
A maioria dos observadores admitem que a vitória de Silvio Berlusconi foi quase absoluta, visto que somou uma importante maioria no Senado e na Câmara, que vai permitir ao próximo governo uma efetiva estabilidade.
No Senado, o bloco conservador alcançou uma margem majoritária de 20 senadores, e na Câmara, de 14 deputados. Diante disso, Walter Veltroni — o derrotado destruidor da esquerda — esperando uma possível colaboração institucional por parte de Berlusconi, tal como aconteceu na Alemanha, entre os conservadores do CDU e a social-democracia, ou na França, com Sarkozy e alguns socialistas, abaixou ainda mais o tom anunciando que “o Partido Democrático, agora, é oposição. Mas será uma oposição responsável tendo abertas as portas ao diálogo sobre as reformas”.
Ilusão meramente vernacular, visto que Berlusconi, e sobretudo seus aliados não têm nenhuma intenção de governar e sobretudo fazer reformas institucionais com a intermediação do neo-opositor Partido Democrata. De fato, Berlusconi e Fini, durante toda a campanha eleitoral, sempre renegaram uma aliança com o PD, que apontavam como um “ produto do artificial do transformismo político dos comunistas”.
Outro motivo, mais objetivo e realista é que se Berlusconi conseguir manter coesa a aliança que fez com a Liga Norte (partido xenófobo de Umberto Bossi) e com a Aliança Nacional (partido ex-fascista de Fini), além de contar com o apoio dos regionalistas da Sicília (Movimento para a Autonomia) certamente não vai precisar, nem sequer, dialogar com o PD de Veltroni.
Neoliberalismo
Este resultado eleitoral, de fato, inverte a tendência européia, na qual a esquerda se juntava à centro-esquerda para “gerenciar com um olhar mais humanitário o duro modelo neoliberal”. A recente vitória de Zapatero na Espanha e a derrota de Sarkozy nas eleições administrativas francesas – visivelmente monopolizadas por socialistas e comunistas – apresentava a mesma perspectiva para a Itália. Inclusive porque a campanha eleitoral de Berlusconi não foi brilhante e, também, porque o grande “centrão” de direita sonhado por Berlusconi com o novo “Partido da Liberdade” não se realizava. A direita mais fascista (La Destra) optava por apresentar sua candidata “fascista” e os antigos democrata-cristã os da UDC de Casini, abandonavam Berlusconi para criar um hipotético centro no centro-direita. Um cenário que, substancialmente enfraquecia o projeto berlusconiano.
Entretanto, estes iniciais fatores negativos foram transformados por Berlusconi em elementos positivos, visto que ele pôde, finalmente, apresentar o PDL como o único partido conservador, católico, inflexível com comunistas, imigrantes e islâmicos e, sobretudo partidário das reformas do mercado.
De fato, o drama desta conjuntura eleitoral é que a maioria do povo italiano gostou de ver Berlusconi e Bossi xingarem a esquerda. Gostaram de ver nas TVs a contínua ridicularizaçã o do Partido Democrata de Veltroni que, por sua parte, continuava alimentando propostas políticas ambíguas sonhando com um possível empate. Consequentemente, com uma solução de tipo alemã, em que direita e centro-esquerda se aquartelavam intimamente no poder sem nenhum problema.
O primeiro ataque
Saídos os resultados eleitorais tudo parecia tranqüilo. As televisões de Berlusconi (Grupo Mediaset) e de Murdok (Sky) alimentavam os sonhos sobre o futuro das reformas institucionais de Berlusconi apontando para a redução dos impostos impopulares atribuídos ao governo Prodi. De repente, este clima de sonho parou. O principal jornal controlado por Berlusconi “Il Corriere della Sera” e a Confederação dos Empresários da Indústria, “Confindustria” irrompem no cenário político italiano formulando o primeiro grande ataque aos sindicatos e aos trabalhadores em geral, com a chamada “inovação política contra as castas sindicais”.
Utilizando a crítica que a própria esquerda fazia à inércia da burocracia sindical, bem como ao acomodamento dos quadros sindicais no aparelho governamental, o jornal de Berlusconi e a Confindustria atacaram a fundo todo o movimento sindical pedindo que o novo governo fizesse uma reforma em que os próprios sindicatos e federações fossem flexibilizados verticalmente.
Além disso, pedindo que o “direito de greve seja sujeito a referendo entre os trabalhadores” . Quer dizer, cada vez que os sindicatos pretendem declarar uma greve, a mesma, antes deverá ser referendada entre os trabalhadores daquele setor ou fábrica. Uma fórmula inteligente para desarticular os sindicatos e enfraquecer as confederações, em particular a CGIL que é o principal reduto nacional da base trabalhadora anti-capitalista e anti-imperialista.
O problema, agora, é saber o que mais vem pela frente, visto que o PD de Veltroni não se manifestou diante da referida proposta de reforma sindical que, se aprovada, vai ser um desastre para todos os trabalhadores que, desta forma, podem ficar sem nenhum amparo diante de um capitalismo, cada vez mais selvagem e autoritário. De fato, esta reforma pretende “liberar” as horas extras que em compensação não seriam taxadas.
A traição do PD
Muitos dizem que o Partido Democrata de Veltroni foi criado em dezembro de 2007 para compor um “bloco progressista” para enfrentar a centro-direita de Berlusconi. Entretanto, a maioria dos analistas admitem que o papel político da tríade do PD, nomeadamente Walter Veltroni, Romano Prodi e Francesco Rutelli foi de “enxugar o campo progressista de todas as forças que contrariam a lógica do mercado, rejeitam o conceito de bipolarismo partidário e que querem partilhar o poder com as reivindicações dos movimentos”.
Esta tarefa foi realizada de forma espetacular, retirando com o voto útil uma grande porcentagem de votos, que, originariamente, eram destinados à “Sinistra Arcobaleno” que representava a nova frente de esquerda formada pela Refundação, Verdes, Socialistas Democratas, PCdI e Sinistra Crítica.
Paradoxalmente, em função do “voto útil” parte dos votos da esquerda foi para um partido como o PD que não quis fazer nenhum tipo de aliança eleitoral com a esquerda enquanto admitia governar em conjunto com Berlusconi caso houvesse um empate. Nunca, Veltroni, declarou que ia governar com a esquerda. Neste sentido, temos que reconhecer, que ele foi muito coerente com a sua traição histórica, juntamente com D’Alema e Faccino – “quadros históricos” formados na lógica do “Compromisso Histórico” do PCI de Berlinguer.
Talvez, esta derrota poderá esclarecer, definitivamente, quem é de fato de esquerda, quem é coerentemente progressita. Enfim, quem é a favor do povo ou do capital.
Esquerda derrotada
Fausto Bertinotti, líder histórico da Rifondazione Comunista e principal candidato da Sinistra Arcobaleno, após os resultados definitivos, logo declarou: “Deixo meu cargo após esta pesada derrota pesada cujo ensinamento será mais profundo que a vitória”. Mas a forma poética de profissional das palavras não pode ocultar as responsabilidades políticas do projeto partidário de Fausto Bertinotti. Sua renúncia, também, não pode justificar o fracasso da frente eleitoral e, sobretudo, não pode silenciar a queda da Refundação que, potencialmente, era o grande puxador de votos e que ficou reduzido a 3%.
Na verdade, a formação eclética da frente Sinistra Arcobaleno apontava para a reunificação dos votos dos “opositores” de todas as vertentes, dos comunistas ortodoxos aos altermundialistas. Uma fórmula que, teoricamente apontava entre 9% e até 9,5% dos votos, dos quais 7% especificadamente para a Rifondazione.
Porém, as bases não engoliram as fábulas de Bertinotti, e julgaram extremamente servente sua atuação no governo Prodi. Aliás, o histórico jornal “Il Manifesto” fez campanha pela abstenção e 3% do eleitorado da esquerda não votou. Outros 2% migraram para o “voto útil do PD” e um irresponsável 1,5% (sobretudo no norte) aderiu às proposta xenófobas da Liga Norte à causa do medo de perder o trabalho por causa dos imigrantes romenos ou aos de origem árabe, que aceitam trabalhar pela metade dos salários oficiais.
Conclusões
Estas primeiras conclusões introduzem as seguintes questões: Por que a esquerda sofreu tal desastre? O que fazer agora?
A principal causa deste desastre foi o destaque entre a vertente institucionalizada dos partidos de esquerda e as bases. Um contexto que se relaciona sobretudo com as novas categorias de trabalhadores que se formaram com a flexibilização nas indústrias e serviços.
A segunda, foi o abandono constante da cultura política e, consequentemente, da formação política, para voar em direção a um movimentismo artisticamente sugerido por Toni Negri, que na realidade promoveu a destruição de valores, símbolos e teorias que marcaram a evolução, as lutas e a afirmação do movimento operário e estudantil. Ter rejeitado o símbolo da estrela e da foice e martelo agradeceu a Veltroni e a Berlusconi, mas irritou profundamente importantes setores da esquerda.
A terceira causa foi a forma “infantil” de como esta esquerda serviu no governo Prodi, traindo quase todas as reivindicações das bases que ficaram silenciadas e sem mais um interlocutor político. Praticamente, no governo Prodi, as vertentes institucionais da esquerda operaram um suicídio político coletivo achando poder renascer com o processo eleitoral. Terrível engano. Péssima análise. Desastre eleitoral e político.
Agora, os italianos deverão suportar mais cinco anos de ditadura do mercado com Berlusconi que – além de fortalecer seus interesses bilionários – vai querer transformar esta terceira República em Quarta República presidencialista, evidentemente com ele no poder. Será isto o início de um novo tipo de ditadura?



Achille Lollo é jornalista italiano

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