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Olimpiadas mais politizadas da historia


Apesar dos apelos feitos na semana passada pelo presidente da China, Hu Jintao, para que o mundo encare as Olimpíadas de Pequim como um espectáculo meramente desportivo - no que faz coro com o presidente do Comité Olímpico Internacional, Jacques Rogge - estes Jogos começam como uma das mais politizadas Olimpíadas da História. E a culpa, diga-se de passagem, é da própria China.


Por Gilberto Scofield Jr., correspondente do jornal O Globo na China


Afinal, Pequim fez questão de ser o anfitrião desta festa com o indisfarçável - e indiscutível - orgulho de um país que, em 30 anos, passou de uma turbulenta, miserável e faminta nação comunista para uma das mais influentes economias emergentes do planeta.
Desde 2001, quando foi escolhida sede dos Jogos de 2008, Pequim investiu 34 mil milhões de dólares na preparação de uma festa que é também a celebração de uma nova China, um país cuja economia quase triplicou de tamanho de 2000 até agora, tornando-se a terceira maior economia do mundo, atrás apenas de EUA e Japão e empatando com a Alemanha, além de ser o terceiro maior país exportador do planeta. Desde a abertura económica, nos anos 80, nada menos que 250 milhões de chineses foram retirados da miséria por conta deste formidável desenvolvimento, o mais rápido já visto num país em toda a História mundial.
Esta China é a que se diz pronta para as Olimpíadas, orgulhosa das suas conquistas, que incluem um arrojado programa de exploração espacial que já colocou em órbita três astronautas. Ou a invejável aldeia com mais de 230 milhões de internautas. Ou ainda o país que, por conta do seu peso no comércio mundial, conseguiu impedir o encerramento da Rodada de Doha da OMC, por muitos considerada o mais importante fórum económico actual. Noutras palavras, a cara da China hoje é muito melhor - e mais influente - do que a cara do país de apenas três décadas atrás, quando Pequim abriu mão do comunismo e abraçou os conceitos mais radicais do capitalismo ocidental (alguns bastante selvagens).
Mas a verdade é que a China é hoje um país de muitas caras. E nem todas dignas de orgulho. Apesar dos esforços para se mostrar ao mundo como um anfitrião olímpico à prova de críticas, o facto é que os Jogos ocorrem num ambiente soterrado de problemas decorrentes de um regime autoritário, burocrático, injusto e centralizador, como violações de direitos humanos, censura dos média e na Internet, poluição ambiental maciça por conta de um crescimento sem parâmetros, corrupção, mais de 30 mil presos políticos, desigualdades crescentes entre ricos e pobres (e entre campo e cidade), abusos laborais e falta de Justiça universal e transparente, para ficar nos problemas mais óbvios.
Diante de um país tão multifacetado, não há como encarar estas Olimpíadas sob um único prisma vencedor. As bandeirinhas pregadas nos carros que circulam por Pequim e Xangai, as mensagens de amor à Pátria deixadas em sítios de bate-papo da internet chinesa mostram uma população orgulhosa.
- Para os chineses, as Olimpíadas representam um sentimento de orgulho nacional. Eles querem que a China seja vista com respeito pelo mundo e os Jogos são uma oportunidade para isso - diz Minxin Pei, diretor do Carnegie Endowment for International Peace, de Washington, um dos maiores estudiosos de China e de processos democráticos na Ásia. - Mas estas expectativas são uma arma perigosa nas mãos do governo chinês, que vê os jogos como uma maneira de se legitimar internacionalmente.
O que explica em parte os acessos de fúria nacionalista vividos pelos chineses quando o mundo começou a protestar após as rebeliões no Tibete e durante a viagem da tocha olímpica ao redor do planeta. Nem o governo, nem os chineses esperavam que o preço a pagar pela festa globalizada das Olimpíadas fosse uma enxurrada de críticas sobre o governo, o seu autoritarismo e a passividade/ manipulação de seu povo.
- A China tinha planos enormes para sua festa de autoglorificaçã o olímpica, mas agora que os Jogos transformaram- se numa realidade ameaçadora, é claro que questões como segurança do regime e protecção à imagem do país tornaram-se as grandes prioridades - diz Kent Ewing, professor da Hong Kong International School.
Num país onde os média e o sistema educacional são braços de propaganda do Partido Comunista, brigou com o governo, brigou com os chineses. E este factor, aliado à falta de transparência do governo comunista de um modo geral, torna a China pouco confiável na tentativa de convencimento mundial de que o seu desenvolvimento económico e militar não é uma ameaça. O escritor e pesquisador Orville Schell, diretor do Centro de Relações EUA-China da Asia Society, afirma que o processo de humilhação da China nas mãos das potências estrangeiras durante meados do século 19 (começando com a Guerra do Ópio) até a invasão japonesa durante a Segunda Guerra Mundial, criou um complexo de inferioridade que está institucionalizado nas mentes chinesas. Esta tendência à vitimização não é de toda repudiada pelo governo chinês, diz ele, porque convém às autoridades de Pequim eleger inimigos externos quando as coisas no país não vão bem.
Pois é sob este contexto - a de uma potência emergente cheia de virtudes e problemas, mas cujo governo autoritário ainda não aprendeu a lidar com críticas - que as Olimpíadas de Pequim devem ser encaradas. Após séculos de regimes imperiais fechados e 50 anos de comunismo idem, as Olimpíadas da era globalizada e da internet deixaram a China exposta como nunca. E como para um morcego acostumado a viver na penumbra, muita luz pode ser menos um alívio e mais uma perturbação.

Artigo publicado originalmente no jornal O Globo, do Rio de Janeiro, retirado do
blog do autor, uma fonte incontornável de informação sobre as Olimpíadas de Pequim.

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